Reflexões à Boca de Cena / Onstage Reflections

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Dez anos após a sua estreia literária, João Ricardo Lopes publicou em 2011 Reflexões à Boca de Cena / Onstage Reflections, em parceria com Bernarda Esteves, que retroverteu os 50 poemas para Inglês.

O livro, mantendo algumas linhas temáticas dos títulos anteriores (designadamente a escrita metapoética e o tom pessimista do discurso, que resvala frequentemente para o existencialismo), apresenta, porém, uma forte discursividade teatral, emergindo dela a consciência feroz de que todo o ato é o seu contrário e que a escrita é a sua própria anulação, fingimento e dramática mentira. César Freitas observou, a propósito deste poemário que «urge que o leitor reconheça o retomar do profícuo tema do fingimento, seja o fingimento dos actores que no teatro da vida simulam o choro e o riso, seja o fingimento que institui a palavra poética, seja o fingimento sentido e percebido nos mais anódinos olhares e comportamentos, onde a ilusão e a indistinção entre a essência que «não cabe nos olhos / nem desliza entre a boca e as palavras» e o que é a sua representação se diluem nas máscaras que de um modo natural cobrem o rosto humano.»

Na edição 100 da revista Os Meus Livros, Andreia Brites destaca o «sentimento de perda que atravessa o livro», assim como os diferentes binómios de que a voz do sujeito poético se entretece: «As reflexões a que o autor se propõe são assim de carácter ontológico e visam, no essencial, a memória como fragmento, momento que se reconta, se recria, mas não se recupera. O amor será a principal prova, em episódios, símbolos e distâncias que se materializam em cartas, objectos e fotografias. […]. Muitos deles constroem-se a partir de binómios como luz e escuridão, ou interior e exterior que, na sua aparente oposição, se combinam a desfazê-la. Esta aproximação de antíteses dá ênfase ao sentimento de perda que atravessa o livro. Uma perda do outro e de si mesmo, por conta do que a relação com o mundo e a passagem do tempo obrigam».

Victor Oliveira Mateus acrescenta que «Este equilíbrio, este subtil – e arguto – doseamento do interno e do externo, este relacionar que adquire mesmo foros de miscigenação, é […] um dos pontos altos da voz poética de João Ricardo Lopes: viver é estar num palco de múltiplos cenários, viver é representar dados papéis repletos de conflitos (não só inter-papeis, mas também intrapapel!), viver é esta incessante procura de um Equilíbrio Instável […], equilíbrio entre o dentro e o fora de nós, mas viver é, acima de tudo, a lucidez e a fidelidade: a nós próprios, aos que nos amam ( porque no esboroado palco do hoje já só esses contam!), ao indizível milagre de estarmos vivos neste espaço que nos foi concedido e de que urge cuidar.»

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